Fugitivos — A Coleção vol. 1: Orgulho e Felicidade

Wilson C.
5 min readSep 9, 2022

--

Eu sempre gostei das equipes teen de super-heróis. Os Jovens Titãs, a Justiça Jovem, os Novos Mutantes e até mesmo os X-Men em algumas de suas muitas encarnações… Todas elas têm algo em comum: além das aventuras de super-heróis, suas histórias lidam com emoções e anseios típicos da idade.

Uma que sempre me fascinou, mas eu nunca tive oportunidade de ler até então, eram os Fugitivos. Com a atual coleção lançada pela Panini eu finalmente pude ler a origem desse grupo tão único dentro do Universo Marvel. Será que eu gostei? (spoiler: eu amei)

O caminho até Fugitivos

Desde os anos 60, a Marvel criou uma marca para si como a editoria com os heróis mais humanos. As primeiras histórias de Homem-Aranha, Quarteto Fantástico, Thor e outros foram a primeira vez em que o público acompanhou super-heróis que não lidavam apenas com o fantástico, mas também — e às vezes principalmente — com problemas cotidianos e reais.

O estilo Marvel foi um sucesso imediato e influenciou toda a indústria pelas décadas seguintes. Mas lá pelo ano de 2003 o mercado de HQs estava bem diferente e, com o primeiro boom dos mangás em solo americano a todo vapor, de repente o velho modo de contar histórias de super-heróis já não era mais suficiente. Foi assim que, para atrair os leitores de mangás, a Marvel criou o selo Tsunami que trazia um estilo de arte próximo ao japonês.

O novo selo teve uma repercussão moderada, com algumas séries fazendo sucesso e outras sendo considerados grandes fracassos. Mas dentre todos os títulos do Tsunami, o que mais surpreendeu foi um grupo de heróis adolescentes chamado Runaways.

Do que se trata

Fugitivos conta a história de seis jovens moradores de Los Angeles que, em uma noite aparentemente comum, espionam uma “reunião” secreta de seus pais e os veem assassinando uma jovem garota. A partir desse evento, eles descobrem seus pais são na verdade um grupo de super-vilões chamado Orgulho, e começam a descobrir verdades e segredos sobre suas famílias e sobre si mesmos.

Nesse primeiro arco, a gente conhece cada membro do grupo e seu papel na equipe:

  • Alex Wilder, líder e estrategista do grupo;
  • Nico Minoru, garota gótica que usa magia através do Cajado do Absoluto;
  • Chase Stein, garoto atleta que rouba de seus pais as Fistigonas, luvas que disparam fogo;
  • Karolina Dean, uma alienígena capaz de voar e emanar luz;
  • Gertrude Yorkes, jovem ativista que possui um link psíquico com o dinossauro Alfazema;
  • Molly Hayes, a mais nova do grupo, uma menina mutante com super-força.

Por sinal, “equipe” aqui é força de expressão, já que eles não são um time de super-heróis tradicional e nem possuem um nome, mas sim um grupo de amigos que só têm um ao outro. Desesperados e sem ter a quem recorrer (porque até a polícia de Los Angeles segue ordens do Orgulho), os seis acabam tendo de “fugir” e daí o “Fugitivos” que dá nome à HQ.

Renovando a Marvel sem deixar de ser Marvel

Anos antes de virar o rei dos quadrinhos indie com títulos Paper Girls e Saga, Brian K. Vaughan tinha seu primeiro grande sucesso aqui com Fugitivos.

Tudo em Orgulho e Felicidade, o arco de estreia, tem ar de novidade. O cenário é Los Angeles ao invés da tradicional Nova York e os protagonistas não se parecem em nada com os heróis supermusculosos com os quais estávamos acostumados (ainda mais logo após os marombados anos 90), mas com típicos adolescentes do início do século.

Eu estou lendo pela primeira vez agora, como um adulto, mas consegui me enxergar nos personagens rapidamente. Porque o que Fugitivos fez de melhor foi modernizar o tal estilo Marvel para os anos 2000, mais especificamente para a geração millenial. Só a primeira cena já é familiar para qualquer nerd millenial: Alex jogando um RPG online e sendo interrompido pelos pais.

Claro, Ultimate Homem-Aranha de Brian Michael Bendis começou isso em 2000, mas Fugitivos consegue ir além, porque, por mais moderno que seja, o Homem-Aranha ainda precisa se ancorar em arquétipos criados nos anos 60. Fugitivos tinha a liberdade de se afastar desses arquétipos, subvertê-los e até mesmo criticá-los.

Esses heróis da nova era não usam uniforme, mas roupas normais que um jovem em 2003 usaria na rua. Da mesma forma que o Quarteto Fantástico originalmente usaria roupas civis quando foi idealizado por Stan Lee e Jack Kirby, e somente adotaram os icônicos trajes azuis por pressão dos leitores.

Dessa vez não houve pressão, porque a ausência de roupas de spandex é justamente um dos aspectos que aproximaram esses personagens do seu público alvo. É um nível de identificação maior do que se tinha antes.

De certa forma, este humilde gibi fez para os anos 2000 o que os pioneiros da Marvel fizeram para os 60: pegar as histórias de super-heróis e torná-las mais identificáveis e autênticas, agora para um novo público.

Outro grande acerto da equipe está em algo que viria a se tornar muito importante nos anos 2010: a diversidade. Só essa primeira formação conta com um negro, uma asiática, uma lésbica e uma garota plus size. Além disso, a maioria dos membros da equipe é de mulheres (até o dinossauro Alfazema é fêmea), algo raro de se ver mesmo nos dias de hoje.

O mais impressionante é que, mesmo se afastando do modelo tradicional de super-heróis, o legado da Marvel está ali. Os dilemas adolescentes do Homem-Aranha, o conflito familiar do Quarteto Fantástico, os dramas novelísticos dos X-Men… está tudo aqui, mas num pacote mais moderno.

Se existe algo a ser criticado aqui é o ritmo acelerado: os Fugitivos descobrem que seus pais são maus e absorvem a informação muito rápido, já pensando em denunciá-los logo em seguida. O mesmo com toda a enxurrada de informações fora do normal que se seguem. Mas claro, isso é compreensível tendo de fechar uma história em seis edições, e o gibi ainda dá pistas que alguns não têm tanta certeza assim do que está acontecendo.

Tudo isso torna Fugitivos uma leitura fascinante: a sua capacidade de trazer algo novo e ainda honrar aquilo que veio antes. É um título recomendado para qualquer fã da Marvel ou de boas tramas adolescentes.

--

--

Wilson C.
Wilson C.

Written by Wilson C.

0 Followers

Fascinado por HQs, filmes, séries, livros e quase tudo relacionado à cultura pop.

No responses yet